24 março, 2011

Suavemente violenta


Era a primeira vez que se viam, alguém fez questão de os apresentar. As horas foram passando, ela confessa que no meio da noite ainda espreitou naquele espaço enorme para ver se o via. E viu, mas não chegou nem lá perto. Sem saber como nem porquê acabou por esbarrar com ele mais uma vez, mas naquele momento ficou e não saiu mais dali, sentia-se bem na sua companhia e já não precisava olhar a sua volta de cinco em cinco minutos à sua procura, ele estava à sua frente. A conversa estava boa, o ambiente era estranho. Ela não fazia parte dali, mas ele compensou tudo isso. Quando deu por si tinha sido raptada por aquele conhecido desconhecido que se encontrava a seu lado naquele momento, naquele lugar. No entrelaçar dos seus dedos encontrou a certeza de o querer para si, mesmo que ali fosse. Já não via nada a sua volta , era como se o conhecesse desde sempre. As suas palavras tinham sido caladas com um beijo que se soltou de um momento para o outro. Apoderaram-se um do outro numa fracção de segundos. Deixaram-se levar como se de duas penas levadas pelo vento, numa brisa fresca de Verão se tratassem. O tempo continuou a correr, não parou, por muito que lhe tivesse parecido, ou que quisesse que sim. Não se sentiam corações bater, só o frio fazia questão de assinalar a sua presença. Quando deu por si estava envolvida no abraço mais quente que  alguma vez tinha sentido, sentia-se pequena a seu lado, mas mais protegida que nunca. O seu respirar fazia-a acreditar que ele estava mesmo ali, era como a suave melodia que entrava no seu ouvido e ecoava no seu peito. O dia foi nascendo, era a única coisa que podiam ver. Eram eles e a claridade a aparecer em seu redor. Não procurava um príncipe, mas foi tratada como uma princesa. Não sabe dizer o que sentia ali, não sabe dizer como lá foi parar. Sabe que foi e será uma das suas melhores noites, era suavemente violenta a envolvência que juntos criaram como duas forças que se atraíem. Se pudesse ainda hoje lá estava. Assegura que sim. Por agora, espera o dia em que vai poder voltar a estar nos braços daquele alguém.

21 março, 2011

Imagem do teu momento

"Fotografia nada mais é do que um cálculo onde as variáveis de soma são luz e criatividade,
 elevadas à paixão daquele momento. "
Encontras superficialmente naquela fotografia parte de um momento. Olhas, mas não significa que vejas. Por detrás daquele segundo em que a máquina disparou depois de um click, estão inúmeros momentos que se completam entre si formando a história daquela imagem, formando a poesia dela mesma. Ali está a essência daquele lugar, rostos que não aparecem, palavras que foram pronunciadas que não estão expressas, arrepios que não são expostos, borboletas na barriga e sentimentos que a muitos nunca hão-de chegar. Podes tirar fotografias a cada minuto, podes encher álbuns e álbuns,  os verdadeiros momentos só num sitio ficarão guardados. Só aí permanecerá o verdadeiro sentido daquelas pequenas imagens que vais passando folha após folha, ou click atrás de click frente ao ecrã do teu computador. Pequenos grandes momentos que falam por si sem dizer uma palavra . São vistos por todos e sentidos por alguns. Mostram uma coisa mas podem muito bem querer dizer outra. Reinam no baú gigante e sem fim, do poço das recordações, e por muito que ajudem a relembrar este e aquele momento, esta e aquela pessoa, este e aquele objecto, aquela conversa , nunca os vão trazer de volta, mas permitem-te vivê-los em determinado instante, reavivam-te a memória de traços que já estavam esquecidos, permitem-te passar a mão por pedaços de ti que deixaram de existir, ver o que pensavas jamais voltar poder alcançar com os teus olhos, pormenores que jamais voltarias a lembrar-te se aquele pequenino pedaço de papel não tivesse existido um dia. Fazem o teu coração bater a um ritmo acelerado, uma lágrima cair ou um sorriso escapulir-se de um rosto, endurecido pelo tempo, inconscientemente. Cada uma delas contas histórias que bem organizadas entre si se escrevem sem canetas nem papel - a vida dela, dele ou do outro. São a mistura de todas artes. Olhas para elas e concentram em si todas as essências mais essenciais, o titulo de uma música, a frase de um livro, a imagem de um outro quadro. A diferença entre os jornais escritos e a literatura passa diferença entre uma foto a preto e branco e essa mesma a cores- como alguém um dia disse. O tempo passa por elas e passa por ti, exactamente da mesma maneira. As mudanças recaem sobre ti a cada dia que passa, mas naquelas fotografias nada muda, a não ser a forma como cada um a vê. Dizem que a fotografia não é mais que o retrato da morte, que marca momentos que passaram, deixando o passado mostrar-se no presente e voltar a fazê-lo num futuro próximo ou longínquo, retrato que fica quando tu te vais.

15 março, 2011

Pânico em saltos altos



Chegou o dia, a hora está próxima. Anda à tempo indeterminado a pensar no momento, naquele momento. Seja um casamento, uma festa ou simples saída a noite com uns amigos. Um dos grandes dilemas da sua cabeça, os saltos altos. Bom era se fosse só isso. São os saltos, a roupa a maquilhagem, o casaco, os brincos, o colar as pulseiras e o penteado. Mil e uma combinações, quando está prestes a decidir, muda tudo e volta à estaca zero. Entra em pânico. É frequente, que aos pormenores de fora, imaginados para agradar um outro alguém que por acaso passe por ela e repare na sua existência,  se juntem as dores psicológicas horas antes do acontecimento, dores nos pés, dores de cabeça, e o pum pum pum que já não saí dos seus ouvidos mesmo antes da sua entrada. Ainda não saiu de casa e já pensa no que irá acontecer. Programa tudo ao pormenor, decidiu finalmente o que usar naquele dia e aquela hora. Olha para o relógio de cinco em cinco segundos, o tempo parece insistir em não passar. Não tem nenhuma noite por aí além combinada, mas sente que algo está p'ra vir. As assombrações voltam ao ataque - e se a maquilhagem não aguenta? e o cabelo vai ficar esplendoroso toda a noite? não vou eu tropeçar entre os saltos e o vestido numa das enumeras pedras da calçada desnivelada. Enfim, instalou-se  a incerteza, de repente sente que nada daquilo está bem. Deixou de sentir-se bem.
Está pronta para sair, o carro está lá em baixo à sua espera, desce uma escada de cada vez tentando não cair por ali... quando chegou a meio destas voltou p'ra trás. Colocou as chaves na porta mais depressa do que alguma vez o tinha feito, entrou como um furação pelo quarto a dentro e revolucionou tudo a sua volta de tal maneira que, tudo se transformou. O belo do vestido provocador deu lugar à camisola semi-decotada e às calças de ganga com um ligeiro corte no joelho. Os saltos altos, para os quais precisava de horas de treino para manter o equilíbrio foram rapidamente substituídos pelas belas botas de imitação de uma marca qualquer sem marca. Os cabelos foram soltos para apenas poderem esvoaçar juntamente com movimentos corporais imaginários que já surgiam na sua cabeça. Pegou na mala  mínima que leva sempre, saiu a correr entrou no carro e não olhou mais p'ra trás, as assombrações deixaram de existir. Era sem dúvida ela própria e não uma boneca de porcelana que se ia passear pelas ruas como tantas outras que lá estavam quando chegou.


Nota: fictício o acontecimento,
real o pânico dos saltos.

11 março, 2011

Faz de conta

Numa altura em que o faz de conta saiu a rua, sem pedir autorização, agradando a uns e chateando tremendamente outros, é altura de pensar no que surge por aí. Pessoas que vestem este ou aquele fato, inserem-se dentro de uma personagem e insistem em passear-se dentro dela por alguns dias. Alguns assumem-na como se fossem parte dela, outros apenas a aplicam superficialmente deixando os pormenores para outra altura, esquecendo-se que estes existem tirando então toda a credibilidade aquilo que desejariam mostrar. Vêm-se pelas ruas, enumeras personagens que há muito já estavam desaparecidas das nossas mentes. Mas, pensando bem, se escavarmos até ao fundo mais fundo da questão. Qual é o dia em que não andamos por aí no faz de conta que... todos os dias, dia após dia, as caras são diferentes. Só as cores exageradas e as maquilhagens carregadas ficam fechados dentro do armário dentro de qualquer coisa que os conserve até ao ano seguinte. Quantas e quantas vezes o que achamos de algo ou alguém muda do dia para a noite e porquê? Porque tivemos o azar ou a sorte de comunicar com aquele alguém no dia em que ele tinha insistido sair de casa, disposto a representar durante aquele dia, qualquer coisa que não é uma realidade, transparecendo coisas erradas para outrem. Quantas e quantas vezes insistimos em fazer de conta que não vimos nem ouvimos nada, ou para não chegar ao ponto em que nos magoa, ou para não sabermos demais e não atingir sem querer um terceiro, como se de uma bala solta se tratasse. Quantas vezes saímos de casa atrasados e não desistimos de nos passear pelas pedras da calçada como se muito a tempo estivesse-mos. Já para não falar nas vezes que sabes que estás perdido e para não dares parte fraca persistes  em seguir aquele caminho na esperança de que no instante seguinte te apareça a rota certa. Diz lá que na maioria das tuas escolhas não seguiste aquilo que sabias que te provavelmente nem te levariam a lugar nenhum, para mostrar a outros que possivelmente estariam errados mesmo sabendo que essa probabilidade era mínima. Podemos pensar também nas vezes em que voamos sem tirar os pés do chão quando nos concentramos no faz de conta que as coisas podem um dia ser assim, quando te pedem que entres na pele de um pássaro que voa livre por aí. Quando imaginas mais que o imaginável. E as vezes que abres os olhos de manhã e o mundo decidiu continuar caído a teus pés, e o que mais queres é ali ficar e voltar a dormir na esperança de que aquilo acabe, mas mesmo assim, levantas-te e metes a tua melhor máscara.  Aquela que te vai permitir esconder tudo isso e mais uma vez fazer de conta que tudo a tua volta acontece as mil maravilhas, quando na verdade gira completamente em sentido oposto aquele que estás a caminhar. Quantas máscaras tens tu? Quantas e quantas vezes queres esquecer coisas, ou simplesmente fazer de conta que não existiram por mais difícil que seja. Quantas e quantas vezes fazemos nós de conta? Quantas vezes por minuto, por hora, por dia, por mês, por ano...Qual a quantidade da tua vida que é passada no faz de conta que fazes de conta? Como havemos algum dia alcançar a perfeição, ou pelo menos chegar lá perto, nesta imperfeição que é o mundo que te rodeia, que te obriga a teres mais máscaras do que dias para as usar.

07 março, 2011

Selo

O primeiro selo oferecido ao blog :

Regras:

1. Dizer quem ofereceu o selo, e comentar o blog da criadora : Contratempo

2. Gostas do blog "contratempo"? Porquê? Gosto muito do blog. Porquê?  Porque a sua criadora escreve como um dia me disseram : "com o coração" .

3. Qual a direcção do teu coração? O meu coração vai na direcção do futuro inserto, vai na direcção do que ainda está para vir, vai na direcção daquilo que o faz bater mesmo sem ele saber, vai na direcção do que pode e não pode, na direcção das maiores alegrias e tristezas, dos melhores e piores momentos, das maiores glórias e dos maiores erros..vai, sem tirar nem pôr, na direcção da vida .

4. O que perdes muitas vezes? Boa pergunta, mas que me lembre não há nada que perca assim com frequência. Isto, se não tivermos a falar de perder a paciência com criancices e coisas do género, isso sim pode tornar-se frequente principalmente em dias maus. Mas, nada que não se resolva.

5. Oferecer este selo a quem tem como destino o teu coração: a todos os seguidores do blog :)

Ps: Obrigado Maria Oliveira .